Nos dias 17 e 18 de junho, na conferência internacional “Paving the Way to the Pact of the Future”, o Ministro da Presidência, António Leitão Amaro, e o Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Nuno Sampaio, reiteraram o compromisso de Portugal relativamente ao Desenvolvimento Sustentável, abrindo caminho à formulação de importantes contributos para a Cimeira do Futuro, que irá ter lugar em setembro, em Nova Iorque.
Durante estes dois dias, discutiram-se os principais desafios para um futuro seguro e sustentável, apresentou-se o relatório de desenvolvimento sustentável 2024, debateu-se o envolvimento dos jovens nos processos de tomada de decisão e elaboração de políticas, a transformação da educação, índices que vão além do PIB, multilateralismo e parcerias. Refletiu-se ainda sobre a agilização das transformações essenciais para um futuro sustentável.
O evento contou com as intervenções iniciais da Comissária Europeia para a Coesão e Reformas, Elisa Ferreira, que realçou o European Green Deal e a importância de uma Lei do Clima comum a todos os Estados-Membros, e da Secretária-Geral Adjunta das Nações Unidas e Presidente do Grupo de Desenvolvimento Sustentável daquela organização internacional, Amina Mohamed (videoconferência), que avançou com uma série de recomendações designadamente ao nível do sistema financeiro para uma sociedade mais cooperativa, justa e pacífica (incluindo uma Nova Agenda para a Paz) que garanta que ninguém fica para trás.
No que respeita à edição de 2024 do Relatório Desenvolvimento Sustentável da Sustainable Development Solutions Network, foram destacados cinco aspetos principais:
- Apenas 16% das metas dos ODS poderão ser alcançadas a nível mundial até 2030, sendo que os restantes 84% manifestam progresso limitado ou até um retrocesso. Desde 2020, o progresso global dos ODS tem estagnado. Os ODS 2 (Fome Zero), ODS 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis), ODS 14 (Vida na Água), ODS 15 (Vida Terrestre) e ODS 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes) apresentam desafios particulares e em Portugal os ODS2, ODS12 (Consumo e Produção Responsáveis), ODS13 (Ação contra a Mudança Global do Clima), ODS14 e ODS17 (Parcerias e Meios de Implementação) são os que se revelam como mais críticos.
- O ritmo de progresso dos ODS apresenta variações significativas. Os países nórdicos continuam a liderar o processo ao passo que as nações pobres e mais vulneráveis permanecem na cauda. A Finlândia ocupa o primeiro lugar, seguida da Suécia, Dinamarca, Alemanha e França. Portugal está classificado em 16.º lugar.
- O desenvolvimento sustentável implica um desafio de investimento a longo prazo. São necessários vários bens públicos que transcendem o estado-nação, pelo que urge reformar a arquitetura financeira global. A mobilização dos níveis necessários de financiamento exige novas instituições, novas formas de financiamento global (incluindo tributação global) e novas prioridades para o financiamento global (como investir em educação de qualidade para todos).
- Os desafios globais exigem cooperação global. Neste domínio, o novo índice de apoio ao multilateralismo baseado na ONU (UN-Mi) classifica os países com base no seu envolvimento com o sistema da ONU. Em 2023, os países mais comprometidos eram Barbados, Antígua e Barbuda e Uruguai, enquanto os menos comprometidos eram os Estados Unidos da América, Somália e Sudão do Sul. Portugal ocupava a 100.ª posição.
- As metas dos ODS relacionadas aos sistemas alimentares e da terra estão particularmente fora de rumo. A avaliação de cenários nacionais sobre a segurança alimentar, mitigação climática, conservação da biodiversidade e qualidade da água até 2030 e 2050, realizada pelo Consórcio FABLE, concluiu que a continuação das atuais tendências ampliará a lacuna entre os países. Deste modo, são possíveis progressos significativos, mas tal exigirá mudanças drásticas (e.g. evitar o consumo excessivo e limitar o consumo de proteínas animais, investir no aumento da produtividade e implementação de sistemas de monitorização inclusivos, robustos e transparentes para deter a desflorestação).
Na discussão do painel “Envolvimento significativo dos Jovens nos Processos de Tomada de Decisão”, participaram Maria Cortés Puch, Vice-Presidente da SDSN Internacional, Francisco Araújo, fundador do Projeto ‘Os 230’, e Ricardo Rio, Presidente da Câmara de Braga. Neste debate, foi referido o trabalho da SDSN face aos jovens, designadamente projetos de mentoria e desenvolvimento de capacidades, partilha de experiências e abertura e apoio ao desenvolvimento de projetos e apresentação de ideias que permitam desenvolver as capacidades das gerações mais jovens. No que concerne ao Projeto ‘Os 230’, de aproximação dos cidadãos e jovens ao poder político, os objetivos são o aprofundamento do conhecimento das figuras que o integram, bem como uma garantia da sua intervenção enquanto contribuidores da decisão política. Ao nível local, foi abordado o trabalho levado a cabo pela Câmara Municipal de Braga, tendo sido destacada a criação de um Centro da Juventude, uma Loja da Juventude e o Conselho Municipal da Juventude, que integra várias estruturas representativas dos jovens que assim têm a oportunidade de ser ouvidos e de apresentar propostas.
No painel “Para além do PIB”, debateram-se as limitações do Produto Interno Bruto (PIB) enquanto indicador de desenvolvimento e qualidade de vida. O economista Alessio Terzi começou por afirmar que o PIB é um indicador importante que demonstra o tamanho da economia, mas não reflete a forma de distribuição da riqueza e dos benefícios ou o contributo de alguns serviços como os providenciados pela natureza ou dos serviços digitais (gratuitos). Por esse motivo, é necessária uma métrica complementar que ajude a medir conceitos mais abrangentes como os do “bem-estar” e “felicidade”. Os ODS oferecem uma visão integrada desta “plenitude”, ao integrar várias outras dimensões com o crescimento económico inclusivo e sustentável (ODS 8). Como demonstrado por Lara Fleischer da OCDE, existe interesse crescente de países e organizações em ir além do PIB, criando-se outras frameworks e dashboards de monitorização de políticas públicas, como o Índice de Desenvolvimento Humano da UN, o Better Life Index da OCDE, ou o Pilar Europeu dos Direitos Sociais da UE. Não obstante ter ocorrido uma atualização regular do conceito do PIB, enquanto indicador, é consensual a necessidade de ir mais longe e trazer para o diálogo ideias inovadoras como a resiliência e a vulnerabilidade dos países ou, noutra perspetiva, o nível de confiança nas instituições.
No painel “Transformar a educação”, participaram Berverly Wenger-Trayner e Étienne Wenger-Trayner, especialistas em teoria do ensino, António Câmara, Professor na Universidade de Lisboa, John Thwaites, Professor na Universidade Monash. Durante a discussão, foi apresentada uma teoria do ensino baseada na valorização de um ensino que permita aos cidadãos fazer a diferença, assente em ‘meaningfulness’ – atribuição de um objetivo claro –, ‘agency’ – capacidade de fazer uma diferença impactante – e ‘identity’ – aprendizagem da identidade pessoal (individual). Neste painel, foi também abordada a lacuna no ensino de questões associadas ao desenvolvimento sustentável, a falta de contacto entre os processos de ensino e as comunidades locais, o papel dos jovens enquanto atores relevantes na construção e liderança de uma mudança no ensino e no desenvolvimento sustentável, e ainda a importância de possibilitar aos jovens experiências que possam ser transformadoras dos respetivos processos de desenvolvimento pessoal, académico e profissional.
No painel “Multilateralismo e Parcerias”, os participantes acordaram sobre a necessidade de aprofundar o multilateralismo, destacando a importância das parcerias internacionais. Ana Paula Fernandes, Presidente do Instituto Camões, I.P. destacou a aposta na cooperação triangular que tem viabilizado importantes medidas. Jeffrey Sachs, da Universidade de Columbia, enfatizou a necessidade de um sistema supranacional com uma autoridade coerciva, defendendo a continuidade do diálogo político e técnico.
Carlos Semedo, Diretor Nacional de Política Externa e Integração Regional de Cabo Verde e Filipe Nascimento, Presidente da Região Autónoma do Príncipe, apresentaram exemplos de instrumentos financeiros inovadores para investimentos verdes em Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, destacando a necessidade de financiamento adaptado às vulnerabilidades específicas de cada país. Manuel Guilherme Júnior, Reitor da Universidade Eduardo Mondlane, em Moçambique, ressaltou o papel da academia na investigação e na partilha de conhecimento para o desenvolvimento sustentável.
Ana Paula Zacarias, Ex-Representante Permanente de Portugal junto das Nações Unidas, sublinhou a necessidade de reformar o sistema financeiro internacional para tratar dos bens públicos globais e atingir os objetivos da Agenda 2030. João José Fernandes, da Direção da Plataforma Portuguesa das ONGD, destacou a importância de uma abordagem inter-geracional e de instrumentos de prospetiva para resolver problemas presentes e futuros. Manuel Lapão, da CPLP, alertou para as ambiguidades nas relações internacionais e defendeu o aumento do multilateralismo e das parcerias para construir sociedades mais resilientes e inclusivas. Neste campo, foi lançado um repto para a criação de uma coligação internacional no domínio da CPLP para a promoção de iniciativas de desenvolvimento sustentável e de direitos humanos. Concluiu-se assim que parcerias eficazes são cruciais para enfrentar os desafios globais do desenvolvimento, como as alterações climáticas e a promoção da sustentabilidade.
Informação adicional
Pode rever ou assistir à conferência na página da SDSN na plataforma Youtube: primeiro dia e segundo dia